Quando encerrou as atividades docentes
em 1988 na rede pública do Estado de São Paulo, a professora Zilda
Halben Guerra percebeu que a aposentadoria não seria como o esperado.
"Eu estava no ponto alto da carreira, com o melhor salário possível na
época, e imaginava que conseguiria descansar e usufruir do meu trabalho.
Mas as regras foram mudadas", relata a educadora, presidente da
Associação dos Professores Aposentados do Magistério Público do Estado
de São Paulo (Apampesp).
Em 1997, as reformas do governo paulista
para os gastos com educação culminaram na Lei Complementar Nº 836, que
estabeleceu um novo plano de carreira e a reclassificação de cargos e
salários para todos os docentes da rede estadual. "Muitos perderam
promoções, pontuação e tempo de aulas dadas. Quem estava na ativa na
época teve tempo de progredir na carreira e garantir salários maiores
para quando deixasse de trabalhar. Os aposentados tiveram de arcar com as perdas", explica Zilda.
Quem se aposenta hoje em instituições
privadas recebe a aposentadoria dentro dos tetos estabelecidos no
Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Na rede pública, que na
maioria dos casos dá o direito de vencimentos integrais, a composição
salarial de um docente é formada por um valor básico mais gratificações,
as quais não seguem com o profissional na aposentadoria. "Há
aposentados que chegaram à assistência de direção e hoje recebem R$ 2
mil. Quem não atingiu cargos de coordenação ou direção tem situação
semelhante. Se precisar pagar aluguel, não come; se precisar de plano de
saúde, não compra remédios. Boa parte do professorado que se aposenta
continua trabalhando. Poucos por opção e muitos outros por não terem
independência financeira e pessoal", conta a presidente da Apampesp.
Construir a aposentadoria
Na avaliação da entidade paulista, os
professores da ativa também aspiram não necessitar do trabalho para
sobreviver após encerrar a carreira, mas no geral não acreditam que
eventos semelhantes aos das gerações anteriores podem acontecer com
eles. "O professor da ativa precisa entender que o aposentado, apesar de
ter contribuído a vida toda, é contabilizado pelos governos como um
peso no orçamento. Uma nova reclassificação pode surgir a qualquer
momento", avalia Zilda.
Segundo a professora, não há um trauma
psicológico na aposentadoria por não poder mais trabalhar, comum em
muitas profissões. As frustrações ocorrem mais durante a parte produtiva
da vida, quando as condições de trabalho são frustrantes. "A carreira
de professor faz a pessoa ser independente intelectualmente, mantém a
mente ativa e lúcida até a idade avançada. Esse profissional se torna um
velho que quer se manter independente. Por isso deve se preparar para
não gerar frustrações na velhice", acrescenta Wally Ferreira Lühmann de
Jesuz, primeira vice-presidente da Apampesp.
Uma alternativa são os aperfeiçoamentos e
titulações, pois melhoram as possibilidades de progressão na carreira e
também abrem portas em instituições privadas de ensino para classes
econômicas mais altas e também no ensino superior, onde há valores mais
altos de horas/aula ou postos de dedicação à pesquisa.
Além das instituições públicas, algumas particulares oferecem cursos de mestrado ou doutorado
gratuitamente, como o Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação da
Universidade Nove de Julho (www.uninove.br), na cidade de São Paulo
(SP). A Fundação Ford também oferece diversas modalidades de bolsas de
pós-graduação, administradas no Brasil pela Fundação Carlos Chagas
(www.fcc.org.br). As pesquisas stricto sensu também podem obter
financiamentos mediante a aprovação de projetos nas Fundações de Amparo à
Pesquisa de cada Estado, no Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPq – www.cnpq.br) e na Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes – www.capes.org.br)
do Ministério da Educação (MEC).
No caso de uma segunda graduação é possível entrar
em programas de bolsas de estudos das próprias instituições privadas de
ensino superior ou optar por empréstimos como o Fundo de Financiamento
Estudantil (Fies – http://sisfiesportal.mec.gov. br/fies.html). Neste
caso, o aluno paga uma taxa de juros anual abaixo da correção da
caderneta de poupança. No entanto, é necessário atenção e planejamento,
pois invariavelmente esse valor é restituído ao governo pelo aluno.
O piso nacional do professor de educação
básica foi reajustado este ano para R$ 1.451 (para 40 horas semanais),
mesmo assim, abaixo da média de outras profissões de nível superior. No
entanto, coletivamente a categoria é significativa. Segundo o relatório
Professores do Brasil: Impasses e Desafios, realizado pelas
pesquisadoras Bernadete Gatti e Elba Siqueira de Sá Barreto, e publicado
em 2009 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e
a Cultura (Unesco), 8,4% das pessoas empregadas no Brasil são
professores. No mesmo ano, a construção civil, área considerada um dos
termômetros daeconomia nacional, era responsável por 4% de todos os
empregos no País.
Aproximadamente 77% dos docentes
trabalham na educação básica; 5,6% no ensino profissionalizante; 0,6% em
educação especial e 16,8% no ensino superior. Além disso, 82,6% dos
postos de trabalho para profissionais de ensino estão nas instituições
públicas. "A representação da docência como 'vocação' e 'missão' de
certa forma afastou socialmente a categoria dos professores da ideia de
uma categoria profissional de trabalhadores que lutam por sua
sobrevivência, prevalecendo a perspectiva de 'doação de si', o que
determinou, e determina em muitos casos, as dificuldades que professores
encontram em sua luta categorial por salários", diz o relatório.
A avaliação apresentada pela Unesco
converge para o ponto de vista da Apampesp: não há como o docente
planejar a aposentadoria apenas individualmente. "A carreira cada um
constrói a sua, mas com a aposentadoria de professor não se sobrevive
decentemente. É necessário lutar pelos direitos devidos e melhorar os já
obtidos pela aposentadoria enquanto ainda se está trabalhando",
finaliza Zilda Halben Guerra.
Fonte: CNTE (REVISTA PROFISSÃO MESTRE, abril de 2012)
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